sexta-feira, 29 de junho de 2012

quarta-feira, 27 de junho de 2012

Entrar no café com um rio na algibeira


Entrei no café com um rio na algibeira
e pu-lo no chão,
a vê-lo correr
da imaginação...

A seguir, tirei do bolso do colete
nuvens e estrelas
e estendi um tapete
de flores
a concebê-las.

Depois, encostado à mesa,
tirei da boca um pássaro a cantar
e enfeitei com ele a Natureza
das árvores em torno
a cheirarem ao luar
que eu imagino.

E agora aqui estou a ouvir
A melodia sem contorno
Deste acaso de existir
-onde só procuro a Beleza
para me iludir
dum destino.

José Gomes Ferreira

quarta-feira, 20 de junho de 2012

Melodias que me fizeram...

David Sylvian - Let The Happiness In

segunda-feira, 18 de junho de 2012

Hoje é o dia das avós

Para mim e muitas outras pessoas. Embora as avós não tenham dias. Têm anos e rugas de bondade eterna, carregadas de amor.
Eis a carta de José Saramago (ele que deixou este mundo há, precisamente, dois anos...) à sua avó Josefa, analfabeta e sempre feliz, no que se revela um relativo mistério para o autor. Como Saramago, nunca vi nem verei olhos tão doces como os da minha Avozinha. De todas as avozinhas. De certeza.  Hoje é o dia das avós. Para mim. E não só.

"Tens noventa anos. És velha, dolorida. Dizes-me que foste a mais bela rapariga do teu tempo – e eu acredito. Não sabes ler. Tens as mãos grossas e deformadas, os pés encortiçados. Carregaste à cabeça toneladas de restolho e lenha, albufeiras de água. Viste nascer o sol todos os dias. De todo o pão que amassaste se faria um banquete universal. Criaste pessoas e gado, meteste os bácoros na tua própria cama quando o frio ameaçava gelá-los. Contaste-me histórias de aparições e lobisomens, velhas questões de família, um crime de morte. Trave da tua casa, lume da tua lareira – sete vezes engravidaste, sete vezes deste à luz.
Não sabes nada do mundo. Não entendes de política, nem de economia, nem de literatura, nem de filosofia, nem de religião. Herdaste umas centenas de palavras práticas, um vocabulário elementar. Com isto viveste e vais vivendo. És sensível às catástrofes e também aos casos de rua, aos casamentos de princesas e ao roubo dos coelhos da vizinha. Tens grandes ódios por motivos de que já perdeste a lembrança, grandes dedicações que assentam em coisa nenhuma. Vives. (...) Transportas contigo o teu pequeno casulo de interesses. E, no entanto, tens os olhos claros e és alegre. O teu riso é como um foguete de cores. Como tu, não vi rir ninguém.
Estou diante de ti, e não entendo. Sou da tua carne e do teu sangue, mas não entendo. Vieste a este mundo e não curaste de saber o que é o mundo. Chegas ao fim da vida, e o mundo ainda é, para ti, o que era quando nasceste: uma interrogação, um mistério inacessível, uma coisa que não faz parte da tua herança: quinhentas palavras, um quintal a que em cinco minutos se dá a volta, uma casa de telha-vã e chão de barro. Aperto a tua mão calosa, passo a minha mão pela tua face enrijada e pelos teus cabelos brancos, partidos pelo peso dos carregos – e continuo a não entender. Foste bela, dizes, e bem vejo que és inteligente. Por que foi então que te roubaram o mundo? Mas disto talvez entenda eu, e dir-te-ia o como, o porquê e o quando se soubesse escolher das minhas inumeráveis palavras as que tu pudesses compreender. Já não vale a pena. O mundo continuará sem ti – e sem mim. Não teremos dito um ao outro o que mais importava.
Não teremos realmente? Eu não te terei dado, porque as minhas palavras não são as tuas, o mundo que te era devido. Fico com esta culpa de que me não acusas – e isso ainda é pior. Mas porquê, avó, porque te sentas tu na soleira da tua porta, aberta para a noite estrelada e imensa, para o céu de que nada sabes e por onde nunca viajarás, para o silêncio dos campos e das árvores assombradas, e dizes, com a tranquila serenidade dos teus noventa anos e o fogo da tua adolescência nunca perdida: “O mundo é tão bonito, e eu tenho tanta pena de morrer!”.
É isto que eu não entendo – mas a culpa não é tua."
José Saramago

quinta-feira, 14 de junho de 2012

O til da paixão

Quando as palavras não sabem nem podem...
...
O mais recente de Fiona Apple (sete anos depois de Extraordinary Machine) é a sublimação do belo e da força num conjunto de canções que são muito mais do que música. É uma alquimia com sentido. Isso não tem preço. É o til da paixao.

Fiona Apple - Every Single Night

terça-feira, 12 de junho de 2012

Melodias que me fizeram...

Martin Stephenson & the Daintees - Piece of the Cake (1986)

sexta-feira, 8 de junho de 2012

Sorriso do dia

Dueto iraniano entre avô e neto (6 anos!).

terça-feira, 5 de junho de 2012

Melodias que me fizeram...

Joy Division - "Love Will Tear Us Apart"

Agregando ideias

Grande Dra. Paula Romão!! As gotas de suor que correram da testa de quem tenta defender o que não tem defesa, dizem bem do que se passou no "Prós e Contras" de há pouco. Foi o discurso de um centímetro a tentar durar o metro; e o discurso de quem sabe, e tem o tamanho de estrada com portagem. A minha homenagem sincera pelo que disse, de forma tão certa, avisada e conhecedora, dando assim voz virtual a quem, como ela, também vive a escola todos os dias e se preocupa verdadeiramente com o futuro deste país.

segunda-feira, 4 de junho de 2012

Estar entre o vento e o olvido

Não sei se respondo ou se pergunto.
Sou uma voz que nasceu na penumbra do vazio.
Estou um pouco ébria e estou crescendo numa pedra.
Não tenho a sabedoria do mel ou a do vinho.
De súbito ergo-me como uma torre de sombra fulgurante.
A minha ebriedade é a da sede e a da chama.
Com esta pequena centelha quero incendiar o silêncio.
O que eu amo não sei. Amo em total abandono.
Sinto a minha boca dentro das árvores e de uma oculta nascente.
Indecisa e ardente, algo ainda não é flor em mim.
Não estou perdida, estou entre o vento e o olvido.
Quero conhecer a minha nudez e ser o azul da presença.
Não sou a destruição cega nem a esperança impossível.
Sou alguém que espera ser aberto por uma palavra.

António Ramos Rosa, Facilidade do Ar

domingo, 3 de junho de 2012

Coisas que já sei há muito

Isto, por exemplo.

Luas

Não gosto de sentir que me enganei. Não gosto mesmo. Mas sei sempre aceitar que posso estar errado relativamente a pessoas ou ideias que tenha como certas. Sempre que tal me é demonstrado, o desgosto do engano passa a gosto. Quis o destino que a conversa com gente bonita me fizesse repensar, de certa forma, Eduardo Sá. Não concordando com algumas das suas ideias relativamente à forma como vê a Educação, tenho de conceder: quem escreve assim, merece um "like"!
"Não sei o que se pode esperar dos anjos, para além de que voem. É-me difícil "vê-los" e desconheço como podem ter asas não tendo costas... Mas, apesar das dúvidas ou das convicções, imagino os anjos parecidos connosco... e a voar. Talvez porque Miguel Ângelo os tenha pintado sem sexo, aos anjos as pessoas associam a ingenuidade e a pureza das crianças. Não penso assim. Imagino que as crianças se parecem com os anjos porque, como eles, voam. Voam quando trazem alguém para os seus sonhos, como voam de encantamento. Há sempre um "alguém" em cada pedaço do nosso crescimento. Quando esse alguém faz de "Ali Babá" e nos traz um "abre-te sésamo", sempre que se chega para nós, voamos pela sua mão. Junto das pessoas que gostam de nós não somos anjos se bem que, com elas, aprendamos a voar. As pessoas crescem a ritmos diferentes e em direcções que, por vezes, as desencontram. Não são os momentos em que sonham ou se encantam que as separa, mas as vezes, de menos, em que não dizem "espera por mim"."

sábado, 2 de junho de 2012

No reino da desdita

Um retrato lúcido e corajoso do Portugal que temos, pela voz de um grande jornalista.