A foto possível, iPhone made |
Quando estamos prestes a ver a performance de Thurston Moore, o que menos esperamos ouvir é "mas quem é este gajo?! É português? (!)". Ou ainda "é o More? Então é o do 007 "(sic). Mas ontem, estes ouvidinhos que limitam a minha cabeça, ouviram isto. Isto e muito mais, naquilo que considero que é fundamental a organização da Capital Europeia de Cultura rever: a política de oferta de bilhetes. É que, fiquei com a ideia, eu, pobre pagante, que à minha volta ninguém sabia ao que ia. E convenhamos que aparecer assim, sem mais, num concerto do guitarrista dos Sonic Youth, pode deixar marcas profundas em muita gente. Sobretudo à desconhecida Rita que, atrás de mim, ouvia os conselhos dos pais relativamente à hora tardia e à eventualidade de ter sono "amanhã, que vais cedo para a escola"!
Moore ajudou à festa. Demorou a aquecer e não é admissível que os quatro músicos subam ao palco sem terem feito o prévio sound check ou afinado as guitarras. Mas foi o que aconteceu: durante dez minutos, Thurston Moore pegou em guitarras; deixou-as cair; afinou-as; bebeu água; entornou água; conversou com os colegas em palco; e terminou dizendo, pleno de ironia, "ready when you are"!
Depois... Bem, depois deu voz à sua Fender Jazzmaster. John Moloney acompanhava à bateria, secundado por Keith Wood (2ªs guitarras) e Samara Lubesky no violino. E partiu para uma performance digna de um old timer que tem feito do palco a sua vida e que, embora muitas das pessoas que ali estavam não soubessem, é uma das lendas da história do Rock.
Thurston Moore, foi mentor dos seus temas e, como sempre, mestre da distorção. Usou o feedback a preceito, alongando talvez de mais os devaneios que rematam os temas, mas quem o foi ver já deveria saber que é assim (não sabiam!). Recuperou temas do seu primeiro a solo, "Psychic Hearts" ("Queen Bee and Her Pals", "Feathers", etc); percorreu "Trees Outside the Academy" (antes de tocar "Fri/End", com intrigante razão, acrescento eu, afirmou "In a way, geek love is the best love") e o seu trabalho mais recente, já para a Matador Records, intitulado "Demolished Thoughts". Aqui residiu a grande novidade. Este seu último trabalho é um álbum de cordas, com pouco ruído de percursão. Melódico, dentro do conceito de melodia de três, quatro, cinco variações de notas repetidas. Ontem, Jonh Moloney, o joker inesperado, que participou na gravação de apenas um tema de "Trees Outside the Academy", trouxe a força que "Demolished Thoughts" necessita, ao vivo. Até ao último dos três regressos ao palco (para desespero da grande família que ocupava o resto da fila onde eu estava, e a quase totalidade da fila de trás), funcionou como um coração pungente. Notável a sua batida. Notável a maneira como as guitarras acústicas se encaixaram no seu ritmo. As cordas de Thurston, Wood e Samara ganharam outra vida. Ganham outra vida. E um concerto que teve tantas pinceladas surreais confirmou-se como um grande concerto. Mesmo porque os incidentes entre temas passaram a fazer todo o sentido. As pausas (imensas) para afinar a guitarra; a cerveja partida num prato da bateria de Moloney; o arroto perdido mas bem ouvido por todos (!); o ter perguntado como se traduzia Portugal (alguém respondeu "good love" e assim ficou!); enfim, de tudo aconteceu ali, num Centro Cultural Vila Flor cheio de um público apreciador e de outro, bem menos, ou mesmo nada.
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