segunda-feira, 27 de outubro de 2014

Vanilla, Strawberry, Knickerbocker glory


Sábado à noite, os britânicos Fujiya & Miyagi apresentaram-se no Porto, no Hard Club, para divulgarem o seu mais recente álbum, “Artificial Sweeteners”. A noite estava perfeita e o espaço acomodou umas poucas centenas de almas em busca do som que o duo de Brighton (Steve Lewis-Fujiya e David Best-Miyagi) vem fazendo desde 2000. Ainda que menos mediáticos, tão ilustre visita merece sempre uma espreitada de corpo inteiro.
Em 2008, a propósito de um concerto de Fujiya & Miyagi a que assisti e que comparei à prova de um vinho (na altura a experiência deixou esta sinestésica impressão), escrevi: "Impenetrável de início. Retinto. Com reflexos púrpura às vezes e de todas as outras cores, outras vezes. Tal como expectável, o nariz foi dominado por um frutado de Transparent Things e Lightbulbs, muito concentrado e potente, coordenado pelo que se ouvia e via, e onde imperavam os aromas de krautrock. Notas de teclas, um poderoso baixo, guitarra e uma inesperada bateria com apontamentos de vai e vem. O palato foi rico e voluptuoso, pouco aveludado como convinha, e onde ninguém se lembrou dos taninos mas que, de certeza, estavam muito bem integrados e envolvidos por sabores de suculentos sons que, lentamente, sem geleia de fruta ou chocolate preto, levaram a um final apoteótico com toda a gente longe da cadeira. Foi assim Fujiya & Miyagi na última sexta-feira, em Famalicão".
Belos tempos!!
Hoje, este palato dificilmente daria origem às mesmas exatas sinapses como registo do que aconteceu no sábado. "Artificial Sweeteners" é um disco bem diferente de "Lightbulbs" que inspirava a visita dos ingleses há seis anos. As tonalidades inspiradas em Can ou Neu! são menos claras e o som que produzem é mais orientado para alguma cadência de Clubbing, com texturas mais eletrónicas, e  ritmos a puxar ainda mais à dança. E foi ao ritmo de temas como "Reyleigh Scattering", "Acid To My Alkaline", "Tetrahydrofolic Acid" ou "Minestrone" (numa versão alargada que me encheu as medidas) que se passou a noite. Ou o vinho evoluiu ou a sinestesia caiu mas, no final, da mesma forma, ficou um sorriso.


quarta-feira, 22 de outubro de 2014

A lua no cinema

A lua foi ao cinema,
passava um filme engraçado,
a história de uma estrela
que não tinha namorado.

Não tinha porque era apenas
uma estrela bem pequena,
dessas que, quando apagam,
ninguém vai dizer, que pena!

Era uma estrela sozinha,
ninguém olhava pra ela,
e toda a luz que ela tinha
cabia numa janela.

A lua ficou tão triste
com aquela história de amor
que até hoje a lua insiste:
— Amanheça, por favor!

Paulo Leminski

sábado, 18 de outubro de 2014

segunda-feira, 13 de outubro de 2014

domingo, 12 de outubro de 2014

quarta-feira, 8 de outubro de 2014

Dicionário de escrita inteligente?!

"As crónicas são um galope diferente, que me seca a cadência do livro e me atrapalha o ritmo. O segredo de escrever é ser estrábico, ter um olho na bola e outro nos jogadores (...) descobri-me lagarto numa pedra, à coca, muito quietinho, rodando as pupilas para sítios diferentes, guloso da mosca de uma frase."
António Lobo Antunes em entrevista à revista Visão (dezembro de 2013)


Era engraçado que o autor destas palavras fosse amanhã premiado. Nunca se sabe. Pode ser que a lógica interna da Academia Sueca considere que dezasseis anos bastam para que se possa premiar outro escritor português.


(Editado às 23:09, 09.10.14
O prémio foi entregue a Patrick Modiano. Ainda não foi desta.)

terça-feira, 7 de outubro de 2014

Down all the way

©iPhone
©iPhone
Morrissey atuou ontem no Coliseu de Lisboa. Estive lá para constatar o que já desconfiava: Steven Patrick Morrissey prestou um mau serviço a quem admira o seu trabalho a solo e a quem o admira pela contribuição dada enquanto frontman dos The Smiths. Ao centrar a sua atuação neste seu último trabalho (The World Peace Is None Of Your Business), Morrissey condenou-se. Em baixo de forma, com um discurso neo-anarca descontextualizado da realidade, e falho nas opções de alinhamento, o espectáculo de ontem valeu pela companhia e pela recriação dos quatro temas dos The Smiths (com destaque para o inesperado "Asleep"). Dispensava este retrato de um dos meus ídolos de juventude mas é um pouco o que fica. A continuar assim, não tarda, Morrissey está pronto para o Rock In Rio. E esse será o ponto mas baixo da sua carreira.

segunda-feira, 6 de outubro de 2014

Melodias que me fizeram...

Bonnie 'Prince' Billy - The Way (2003)

sexta-feira, 3 de outubro de 2014

Sinais dos tempos

A atriz Kirsten Dunst em vídeo que chama a atenção para a crescente perda de humanidade dos contatos pessoais. Critica-se a sobreposição da vida virtual relativamente à mais física, mais real, no que é, um pouco, o retrato do hoje.

quarta-feira, 1 de outubro de 2014

é tudo mais forte do que nós

"um problema com o ser-se velho é o de julgarem que ainda devemos aprender coisas quando, na verdade, estamos a desaprendê-las, e faz todo o sentido que assim seja para que nos afundemos inconscientemente na iminência do desaparecimento. a inconsciência apaga as dores, claro, e apaga as alegrias, mas já não são muitas as alegrias e no resultado da conta é bem-visto que a cabeça dos velhos se destitua da razão para que, tão de frente à morte, não entremos em pânico. a repreensão contínua passa por essa esperança imbecil de que amanhã estejamos mais espertos quando, pelas leis mais definidoras da vida, devemos só perder capacidades. a esperança que se deposita na criança tem de ser inversa à que se nos dirige. e quando eu fico bloqueado, tão irritado com isso sem dúvida, não é por estar imaturo e esperar vir a ser melhor, é por estar maduro de mais e ir como que apodrecendo, igual aos frutos. nós sabemos que erramos e sabemos que, na distração cada vez maior, na perda de reflexos e de agilidade mental, fazemos coisas sem saber e não as fazemos por estupidez. fazemos por descoordenação entre o que está certo e o que nos parece certo e até sabemos que isso de certo ou errado é muito relativo. é tudo mais forte do que nós."

Valter Hugo Mãe